Conceito de Retribuição - Abono de Viagem

12/10/2016

O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que o abono de viagem não tem natureza retributiva e não integra as retribuições a que o trabalhador tem direito e que devam ser contabilizadas no pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

O caso

Um carteiro, contratado em 1980 e admitido para o quadro permanente da empresa em 1985, recorreu a tribunal reclamando contra o facto de os CTT, ao longo de todos esses anos, não terem contabilizado no pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal determinadas quantias que ele auferira com caráter periódico e regular.

Em causa estava o pagamento, em diversos meses, de quantias variáveis a título de trabalho suplementar, trabalho noturno, compensação horário incómodo, compensação especial, compensação especial de distribuição e abono de viagem.

A ação foi julgada parcialmente procedente, decisão com a qual os CTT não se conformaram, tendo recorrido para o TRG pondo em causa que fossem devidos juros e diferenças retributivas anteriores a maio de 1992, por prescrição, e que pudessem ser consideradas regulares e periódicas atribuições patrimoniais suplementares pagas menos de 11 vezes por ano, e defendendo que o abono de viagem e a compensação especial não tinham natureza retributiva.

Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães

O TRG concedeu parcial provimento ao recurso, ao decidir que o abono de viagem não tem natureza retributiva e não integra as retribuições a que o trabalhador tem direito e que devam ser contabilizadas no pagamento das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Segundo o TRG, todas as prestações pagas regular e periodicamente, pelo menos durante seis meses por ano, destinadas a compensar o trabalhador por uma dada atividade, desenvolvida em determinadas circunstâncias e diretamente ligadas ao serviço prestado pelo trabalhador, devem integrar a retribuição de férias, o correspondente subsídio e o subsídio de Natal.

Sendo que, desde que se verifique essa relação direta com a prestação de trabalho, se presume, até prova em contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação paga pelo empregador ao trabalhador.

Porém, da noção de retribuição estão excluídas, em regra, as transferências destinadas a pagar encargos que o trabalhador suporta ou tem de suportar pelo mero facto de trabalhar, como ajudas de custo, despesas de transporte, abonos de instalação, abonos de falhas, abonos de viagem e subsídios de refeição.

Nesse sentido, não tem natureza retributiva a verba recebida para pagamento de valores bastante variáveis a título de abono de viagem, destinados a compensar o trabalhador sempre que, por necessidade de serviço, tivesse que se deslocar em transporte próprio. Razão pela qual, estando em regra excluída a natureza retributiva dos abonos de viagem, não pode operar a referida presunção legal, competindo, antes, ao trabalhador, caso pretenda ver reconhecida a natureza retributiva desses abonos, na parte que excedam as respetivas despesas normais, fazer a correspondente prova.

O TRG decidiu, ainda, que só começa a correr o prazo de prescrição de um ano relativamente aos juros de mora devidos em função do incumprimento de créditos laborais, no dia seguinte ao da cessação do respetivo contrato de trabalho. Durante esse período o trabalhador pode sempre reclamar os seus créditos, incluindo os juros moratórios, sem que essa sua reclamação possa ser considerada abusiva.

O facto de o empregador defender outro entendimento quanto aos valores que devem ser considerados para o cálculo do montante devido a título de férias, o correspondente subsídio e o subsídio de Natal não impede o vencimento imediato da obrigação nem a isenta do dever de pagar juros de mora.

Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 47/14.9TTGMR.G1, de 30 de junho de 2016
Código do Trabalho de 2003, artigo 381.º
Código do Trabalho de 2009, artigos 260.º e 337.º
Código Civil, artigo 334.º
www.lexpoint.pt